Os Sete Novelos – Um conto de Kwanzaa

uma história de Angela Shelf Medearis

Numa pequena aldeia africana do país de Gana, viviam um senhor e seus sete filhos. Depois da morte da esposa, o velho homem tornou-se pai e mãe dos garotos. Os sete irmãos eram muito bonitos. A pele deles era tão lisa e escura quanto o ébano mais legítimo. O semblante era tão teso e forte quanto a lança de um guerreiro.
Mas o velho vivia decepcionado com os filhos. Do raiar do sol até a alta noite, a pequena casa da família era preenchida pelo som das discussões entre os irmãos.
Tão logo o sol raiava, os irmãos começavam a discutir. Eles discutiam a manhã toda sobre como cultivar as plantações. Discutiam a tarde toda sobre o clima.
- Está quente - falava o filho do meio.
- Não, uma brisa suave está soprando - retrucava o segundo filho.
Também discutiam no final da tarde sobre quando voltar para casa.
- Logo vai escurecer - ralhava o mais novo. - Vamos terminar essa fileira e começar uma nova amanhã.
- Mas é muito cedo - observava o terceiro filho.
- Não vê que o sol está se pondo? - berrava o sexto.
E seguia-se essa rotina, até que a lua despontasse e as estrelas brilhassem no céu.
Na hora do jantar, os rapazes discutiam até que o ensopado ficasse frio e o angu estivesse duro.
- Você deu mais para ele do que para mim - choramingava o terceiro filho.
- Eu dividi a comida igualmente - dizia o pai.
- Só isso de comida no meu prato? Vou ficar com fome... - reclamava o mais novo.
- Se você não quer, então me dê! - esbravejava o mais velho, pegando um pouco de carne do prato do irmão.
- Pare de ser tão esfomeado! - falava o mais novo.
E assim prosseguiam noite após noite. Muitas vezes a manhã chegava antes do fim do jantar.
Num triste dia, o velho pai morreu e foi enterrado. Na manhã seguinte, ao alvorecer, o chefe da aldeia do povo axânti convocou os irmãos para uma reunião.
- Seu pai deixou-lhes uma herança - disse o chefe.
Os irmãos cochicharam empolgados.
- Sei que meu pai deixou tudo para mim, pois sou o mais velho.
- E eu sei que meu pai deixou tudo para mim, pois sou o filho mais novo.
- Ele deixou tudo para mim - disso o do meio. - Eu era o seu filho favorito.
- Eh! - exaltou o segundo. - É tudo meu!
Os irmãos começaram a gritar e a empurrar uns aos outros, e logo os sete rolavam no chão, distribuindo socos e pontapés sobre quem estivesse ao seu alcance.
- Parem com isso agora! - grito ou chefe.
Então os rapazes pararam de brigar. Sacudiram a poeira de suas roupas e sentaram-se diante do chefe, olhando-se ressabiados.
- O pai de vocês decretou que todas as suas posses e propriedades serão divididas igualmente - disse o chefe. - Mas, primeiro, vocês terão que a aprender a fazer ouro com estes novelos de fios de seda até que a lua surja na noite. Caso contrário, serão expulsos de casa como mendigos.
O irmão mais velho recebeu um novelo azul. O segundo, um vermelho. O seguinte, um novelo amarelo. Ao irmão do meio foi dado um novelo laranja; ao outro verde; o próximo recebeu um novelo preto e o caçula ganhou um novelo branco. Pela primeira vez, os irmãos ficaram quietos.
Disse o chefe, de novo:
- De agora em diante, vocês não devem discutir entre si, nem erguer o braço com raiva, um contra o outro. Se o fizerem, a propriedade e todas as posses de seu pai serão igualmente distribuídas entre os aldeões mais pobres. Corram, vocês têm pouco tempo.
Todos se curvaram perante o chefe e saíram depressa.
Quando os sete irmãos axântis chegaram à fazenda, algo incomum aconteceu: eles se sentaram lado a lado, do mais velho ao mais novo, sem dizer nada ríspido.
- Meus irmãos - disse o mais velho depois de um tempo -, vamos dar as mãos e selar a paz entre nós.
- Que nunca tenhamos de discutir ou brigar de novo - completou o irmão mais novo.
Deram as mãos e apertaram firmemente.
Pela primeira vez em anos, a paz repousou dentro das paredes daquela casa.
- Queridos irmãos - disse calmamente o terceiro -, nosso pais nunca nos largaria no mundo como mendigos.
- Nunca - concordou o irmão do meio. - Não acredito que nosso pai tivesse nos dado a tarefa de transformar fios em ouro se ela fosse impossível.
- E se pequenos pedaços de ouro estiverem escondidos nesses novelos? - disso o irmão mais velho.
O sol brilhou forte no céu. Feixes dourados de luz invadiram o interior da cabana. Cada irmão levantou seu novelo, fazendo com que as lindas cores brilhassem à luz do sol. Mas não havia nada de ouro nos novelos.
- Receio que não, meu irmão - disse o sexto filho. - Mas foi uma boa ideia.
- Obrigado - agradeceu o mais velho.
- E se fizermos algo com esses novelos para ganhar um pouco de ouro? - sugeriu o mais novo.
- Talvez possamos fazer tecido com esses fios e vender - disse o mais velho - Acho que conseguiremos.
- É um bom plano - ponderou o do meio. - Mas não temos fios suficientes de uma só cor para fazer uma peça inteira de tecido.
- E se trançarmos todos os fios para fazer um tecido multicolorido? - disse o terceiro filho.
- Mas nosso povo não usa roupas com tecidos coloridos - lembrou o quinto. - Só usamos tecidos de uma cor só.
- Mas podemos fazer um tecido tão especial que todos irão querer usar! - refletiu o segundo.
- Meus irmãos - disse o sexto filho -, vamos terminar mais rápido se trabalharmos todos juntos.
- Sei que conseguiremos - respondeu o filho do meio.
Os sete irmãos axântis lançaram-se ao trabalho. Juntos, cortaram madeira para fazer um tear. Os mais novos seguravam as peças para que os mais velhos montassem o tear.
Eles se revezaram para urdir os fios em tecidos com listras e formas que lembravam asas de pássaros. Usaram todas as cores: azul, vermelho, amarelo, laranja, verde, preto e branco.
Em pouco tempo, os irmãos tinham várias peças de lindos tecidos multicoloridos.
Quando terminara de urdir os fios, os irmãos se revezaram também para dobras os tecidos coloridos. Então os guardaram em sete cestas e colocaram as cestas sobre as cabeças.
Formaram uma fila, começando pelo mais velhos até o mais novo, e tomaram o caminho da aldeia. O sol vagarosamente trilhou seu percurso dourado sobre o céu, enquanto os irmãos seguiam o mais rápido que podiam pela longa estrada poeirenta.
Assim que chegaram à praça do mercado, os sete axântis gritaram:
- Venham comprar o tecido mais maravilhoso do mundo! Venham comprar o tecido mais maravilhoso do mundo!
Desdobraram uma peça e ergueram-na, para que todos pudessem ver. O tecido colorido cintilou como o arco-íris, atraindo uma multidão ao seu redor.
- Oh! - exclamou um aldeão. - Eu nunca vi um tecido tão bonito! Que diferente!
- Ah! - exclamou outro. - Esse é o tecido mais fino da terra! Sinta a textura!
Os irmãos sorriram, orgulhosos. De repente, um homem vestido com uma magnífica túnica abriu caminho pela multidão. Todos recuaram em sinal de respeito, pois era o tesoureiro do rei. Ele esfregou o tecido entre suas mãos e o levantou na direção do sol.
- Quanta beleza! - disse, manuseando o material. - Este tecido será um presente digno para um rei! Quero comprar tudo.
Os sete irmãos cochicharam.
- Um tecido digno de um rei deve ser adquirido por um preço que só um rei pode pagar - disse o mais velho.
- O tecido será todo seu por um saco de ouro.
- Negócio fechado - disso o tesoureiro, que estendeu seu saco em direção aos irmãos, derramando várias peças de ouro.
Os sete axântis correram em direção à cabana do chefe. Uma lua brilhante e prateada começava a despontar no céu. Muito ofegantes e pingando de suor, os irmãos se atiraram ao chão diante da cabana.
- Veja, chefe - arfava o mais velho -, transformamos os novelos de fios de seda em ouro!
O chefe saiu da cabana e sentou-se em um banquinho.
O irmão mais velho esparramou o ouro pelo chão.
- Vocês brigaram ou discutiram hoje? - perguntou o chefe.
- Não, meu chefe - respondeu o mais novo. - Estivemos tão ocupados, trabalhando juntos, que não tivéssemos tempo de brigar ou discutir.
- Então vocês aprenderam a lição que seu pai queria ensinar-lhes - disse o chefe. - Tudo que ele possuía agora pertence a vocês.
Os irmãos mais velhos sorriram felizes, mas o caçula parecia triste.
- E quanto às pessoas pobres da aldeia? - perguntou.
- Nós recebemos a nossa herança e eles ficaram sem nada. O que eles farão?
- E se nós os ensinássemos a transformar fios em ouro? - sugeriu o mais velho.
O chefe sorriu: - Vocês aprenderam bem a lição.
Os sete irmãos axântis ensinaram seu povo com perfeição. A aldeia tornou-se tão famosa e próspera por seus lindos tecidos multicoloridos.
Daquele dia em diante, os sete irmãos trabalham juntos no cultivo da terra.
E eles trabalham em harmonia, em respeito à memória de seu pai.

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